sábado, 26 de setembro de 2009

Confabulando com Marvin pt. II & III

PARTE 02 - SUÉLEN.
Acordar na segunda-feira às seis horas da manhã nos trás um sentimento similar à uma tortura medieval. Eu, felizmente nunca fui submetido à este tipo de tortura, mas acredito piamente que a sensação de estar sentado diante de uma Donzela de Ferro seja muito parecida com que estou sentindo agora.

Um banho gelado ajuda a acordar de vez.Tomei o meu café na sala, assistindo ao telejornal, fiquei surpreso com tanta notícia boa.
Desliguei a TV, acho que amanhã assistirei alguns desenhos animados.
A caminho do trabalho eu a encontrei, Suélen, a loira da casa 67. Como meu velho pai costumava dizer, um mulherão.
- Oi, Melvin... bom dia!- Muito melhor agora, Suélen!
Ela é do tipo que os homens costumam chamar de "gordinha gostosa".
(Tanta carne! E eu aqui, roendo osso...)

- Está indo para o trabalho?
- É né, vamos ajudar alguém a enriquecer.
- Haha! Sempre bem humorado...
Se ela soubesse como está meu humor...
- Acho que descobri isso em algum livro de auto-ajuda.
- Ah! Você também lê esses livros?
E agora, o que eu faço? Digo à ela que acho esses livros uma verdadeira perda de tempo, e que não ajudam niguém além de seus próprios autores, que ganham a vida tentando dizer às pessoas como sorrir, ou tento agir politicamente e digo que aprecio muito este tipo de "entretenimento"?
- O que você faz na rua à este horário?
(Sim, achei melhor mudar de assunto)
- Caí da cama, acredita?
Conversando com Suélen, me senti um pouco melhor, e por um motivo ambíguo, porque ao mesmo tempo em que eu a desejo, considero-a uma porta. Algumas pessoas que nascem em berço de ouro têm esta tendência, talvez por não terem lutado o suficiente, talvez por darem menos valor ao que são, mas eu te pergunto, e você, daria devido valor?
- Melvin, estou lendo um livro ótimo!
- Qual livro?
- Maria Dolores
(putaqueopariu!)
- E do que se trata?- Ah, é um drama lindo sobre uma mulher que entra em depressão por causa de uma unha encravada.
(Franz Kafka se contorce no túmulo)
- Nossa, que trágico!
Eu sinceramente gostaria de me divertir e me emocionar com coisas tão ridículas, acho que já fui assim um dia.
- Olha, Suélen eu gostaria de ficar aqui conversando contigo sobre a Maria Dolores (argh!) mas estou atrasado para o trabalho, vamos combinar de nos encontrarmos no final desta semana, ok?
Ela disse que sim, claro! Mas o que é CLARO, é que não vamos nos encontrar mesmo. Se bem que, se for para ficar conversando sobre Maria Dolores, prefiro ficar em casa lendo algo mais construtivo, como Charles Bukowski.
PARTE 03 - REENCONTRO.
No trabalho as coisas foram como sempre, aquela rotina cansativa, aquela falsidade com os colegas e por aí vai.
Quando cheguei em casa, me surpreendi com o cheiro de cerveja que estava instalado definitivamente na sala, ontem eu derrubei nada menos do que três latas e não movi um músculo para limpar, a bebedeira e toda aquela estória da barata me impediram.

Falando em barata, ontem aquela filha da puta me xingou.(ainda "não acredito que estou acreditando" nessa estória).
- BARATA, ESTÁ AÍ?!(me sinto o pior dos seres humanos gritando isso).
- Não precisa gritar, estou aqui, bem atrás de você!
Pelo menos agora não posso culpar a bebida.
- Cara, não me chame de barata, por acaso eu fico lhe chamando de homem, ou de ser humano? Eu tenho nome!
- Que curioso, baratas também têm nome. Qual é o seu?
- Marvin, e o seu?
- Melvin.
Alguém aí já conversou com uma barata ou com algum inseto?
- Há quanto tempo você vive aqui? Perguntou Marvin.
- Eu é quem pergunto isso para você, afinal de contas, a casa é minha!
- Melvin, estou há pouco mais de duas semanas, sou uma barata de esgoto, mas achei este lugar um pouco mais aconchegante.
- Ah, obrigado! É bom saber que minha casa não é similar a um esgoto.
- E hoje, vai ter cerveja?
Duas semanas na minha casa e até a barata está bebendo, será por isso que meus parentes não vêm me visitar?
- Não costumo beber às segundas.
- Ah! Corta essa, sente aí e vamos conversar, afinal de contas, agora moramos juntos.
Não resisti à este convite tão excêntrico, não é todo dia que temos a oportunidade de tomar uma cerveja ao lado de uma barata tão simpática.
- Marvin, como você deve ter percebido, estou perplexo em estar conversando com uma barata.
- Sim, uma barata americana, da espécie Periplaneta Americana.
- Vivendo e aprendendo, uma barata americana, só falta começar a falar em inglês agora!
- Do you really want to talk in english?

(putaqueopariu!)
- Me fale um pouco de você, é comum as baratas se comunicarem desta forma?
- Não sei, cara! Eu tomei a coragem de falar com você, pois estou vivendo sozinho aqui, depois que saí do esgoto e abandonei minha família e amigos, passei a pensar demais na minha vida e na vida das baratas, eu já não sei quanto tempo de vida eu tenho, geralmente as baratas de minha espécie têm um ciclo de vida que gira em torno de 265 dias.
- Entendo.
- Então eu resolvi fazer diferente, ao invés de fugir dos seres humanos, por que não tentar se envolver com eles? E eu vi em você um cara ideal para tentar uma aproximação, tem mais cerveja aí?
Fui à geladeira e enchi novamente a tampa de garrafa, de onde Marvin degustava aquela cerveja gelada, era difícil de encher a tampa, e a barata era exigente, ainda queria sem colarinho.

Um comentário:

  1. Marvin conseguiu mais a atenção de Melvin do que a Suélen (conseguiria a minha também). Afinal Melvin teve a oportunidade de se comunicar com o ser mais importante da esfera terrestre. Ainda acredito que viemos aqui para controlar a população de barata e ele pacificamente divide a cerveja. Só algumas literaturas exploram esse contato com os amiguinhos de Marvin: Almoço Nu, A Paixão segundo G.H. e a Metamorfose. Melvin deve aproveitar para discutir politica mundial ou simplesmente ensinar a barata a fumar.

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