domingo, 20 de setembro de 2009

Cerveja para nada.


♣ Victor Marques



Uma tarde de sexta como qualquer outra. Nem frio e nem calor de mais, o sol já estava na altura da janela da sala e eu lia qualquer coisa sentado no sofá. A idéia de passar a noite lá me irritava. Estava na expectativa do telefone tocar e ser convidado para tomar umas . Cinco horas da tarde e nada. Mas não tive que esperar muito, um amigo meu me ligou e disse:

-Victor, vamos tomar umas?

-Claro, me encontre em meia hora no Gago.

-Estarei lá.

Desliguei. Fiquei feliz, há tempos não via o Gago, ele era o dono do bar que freqüentava, era um sujeito muito boa gente, mesmo sendo evangélico, nos atendia muito bem. Era um sujeito baixo, moreno, passava dos quarenta anos. Seu bar era agradável, apesar de estar sempre imundo e fedendo a gordura. Lá o forte não era a venda de bebidas e sim comida. Talvez por isso fosse tão agradável beber lá. Ele não sabia servir doses, sempre colocava meio copo grande com rum pela metade por uma módica quantia.

Cheguei primeiro, cumprimentei o Gago, ele demorou cerca de cinco minutos para fazer o mesmo, definitivamente ele fazia jus ao apelido. Não precisei nem pedir, ele logo trouxe um Camel e um cinzeiro de metal já muito queimado. Não tardou para que pedisse uma cerveja e uma dose de rum carta ouro com limão, os dois em copos grandes.

Lá veio ele e colocou um prato com o limão e os copos na minha frente. O bar estava vazio. Apesar de não vender muitas bebidas, sempre havia um ou dois bêbados no balcão. O frentista do posto de gasolina próximo estava lá, entornando seu rabo de galo. Também estavam lá alguns pedreiros que jantavam e um casal com duas crianças que ficavam estourando biribas dentro do bar.

Estava sentado perto do banheiro, onde podia ver o bar inteiro, o balcão prateado com uma estufa cheia de torresmos, pés de galinha, coxinhas.

Meu amigo chegou, a cerveja e o rum já estavam pela metade, tomei o rum de uma só vez e fiz o mesmo com a cerveja que restava no copo. Pedimos mais um copo e mais uma cerveja. Brindamos. Acendi um cigarro e coloquei a cadeira sobre seus pés traseiros, para encostá-la na parede.

Após um curto período a mesa estava ficando cheia, já havíamos tomado oito garrafas e não tínhamos pressa e nem pretensão de parar tão cedo. Versávamos sobre tudo, desde o programa evangélico que era exibido na televisão até Gil Vicente.

O bar estava-se esvaziando, as crianças já tinham ido. Estávamos acompanhados por dois bêbados. De repente entra um casal. Ele já era conhecido da gente, traficava drogas por aqui, mas era inofensivo. Geralmente estava louco com suas próprias drogas. Sua mãe era uma mendiga famosa do bairro. Ela tinha um rosto familiar, mas não me recordava de onde a conhecia. Exibia uma barriga de mãe de sete filhos, uma calça de lycra agarrada, cabelos encaracolados e descoloridos, e sua cara era de puta.

Com sete mesas vazias, eles sentaram bem na que estava do nosso lado, a princípio achei que nos ofereceriam drogas, mas não o fizeram. Pelo contrário, a mulher ficou falando que éramos bonitos e ficou caçando assunto, o que não parecia nos interessar muito.

-Posso pagar uma cerveja para vocês?

-Claro. Respondi.

-É, hoje é sexta, é dia de beber mesmo, não é?

-É, é sim, vamos beber.

Parece que a cerveja grátis tem outro gosto. Bebemos.

-Outra?

-Por que não?

E lá estávamos, nós, bebendo de graça, e eles pagando. Após quatro ou cinco garrafas de graça, meu amigo levantou e foi ao banheiro. Ao voltar disse que precisava ir para casa, jogou uma nota de vinte na mesa e disse que era para pagar as que já tínhamos tomado. Continuei lá sentado, bebendo.

Guardei a nota de vinte na carteira e me despedi do meu amigo. O sujeito que acompanhava a mulher parecia não se importar em bancar as cervejas que eu ainda iria beber. Tomei mais umas três ou quatro quando eles pediram ao dono do bar duas doses de vodca e um copo de suco de laranja. A mulher prontamente perguntou:

-E você, não quer alguma coisa mais forte.

-Um rum com limão.

-Com coca?

-Não, puro.

Eles ficaram um pouco impressionados como bebia aquilo. Depois de duas doses de rum voltei a alternar o rum com cerveja. Até me ofereci para pagar uma cerveja para eles, só para não parecer que queria ficar bêbado as custas deles; Eles recusaram. Ainda bem.

O sujeito se levantou e disse que ia fumar na rua. Sabia muito bem o que queria, cheirar cocaína. Parece que a mulher sabia muito bem disso. Deveria demorar cerca de meia hora. Disse que o bar não tinha o cigarro que ele fumava e se foi.

Pedi licença para a mulher que não me dei ao trabalho de perguntar o nome. Precisava usar o banheiro. Levei minha mochila comigo para não correr o risco de tomar um golpe. Estava dando uma longa urinada quando senti a porta do banheiro se abrindo atrás de mim. Era a mulher.

-Se incomoda se eu ficar um pouco aqui?

-Para ser sincero, não, mas talvez demore um pouco para acabar.

-Não quero usar o banheiro, só vim aqui para olhar.

-Pois deu azar, estou de costas para você.

-Isso não significa que não possa virar.

-Tem razão, mas quem disse que irei virar?

-E todas as cervejas que eu paguei?

-Fico muito agradecido por todas elas.

-Só isso?

-Não vou trepar com você aqui dentro.

-Que tal em outro lugar?

-Não, obrigado, consigo coisa melhor, não achei meu pau no lixo.

Mesmo assim ela ficou atrás de mim até eu acabar. Virei-me antes de fechar a calça, só para não deixá-la a ver navios. Ela observou o gesto calorosamente e começou a retribuí-lo abrindo o zíper de sua calça.

-Nem se dê ao trabalho, não quero nada que você possa ter dentro de sua calcinha.

Ela saiu e eu saí bem atrás, o dono do bar nos fitava com uma cara odiosa, mas sabia que eu não havia feito nada, já tinha me visto com outras mulheres bonitas, no fundo ele sabia que não desperdiçaria meu tempo com ela.

Tomei meu último copo de cerveja antes do par da vagabunda chegar. Paguei as que tinha bebido por minha conta e me despedi do dono do bar.

Atravessei a rua e caminhei até uma loja de conveniência onde também era cliente, pedi outro maço de cigarros e deixei três cervejas pagas.

Fui tomando vagarosamente, acompanhadas de muitos cigarros, aliviado de não ter fodido aquela piranha no banheiro do bar. Ou em qualquer outro lugar.

Quando eram quase duas da manhã, minhas cervejas já tinham acabado. Olhei para o maço de cigarros, tinha o suficiente. Fui até o balcão e pedi mais duas, uma que pagaria e a outra acertaria no outro dia.

Sentei-me na mesa do lado de fora e tomei as duas cervejas muito rapidamente. Enquanto estava na metade da segunda observei uma mulher de uns quarenta e cinco anos se aproximando, nunca a tinha visto por ali, não era feia, tampouco bonita, usava uma calça jeans folgada e uma jaqueta preta. Entrou na loja e saiu com uma cerveja. Pediu-me o isqueiro emprestado. Acendi o cigarro para ela e começamos a conversar sobre qualquer bobagem.

-Posso pagar uma cerveja para você?

-Claro. Respondi.

5 comentários:

  1. Muito bom, bebum de primeira categoria! Bukowski visita o Brasil!

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  2. O texto é muito bom e os diálogos são fluentes, curti muito.

    Mais Bukowski, impossível!

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  3. Mais Bukowski que isso, só o prórpio Bukowski...rs

    Conto legal com umas tiradas legais também.

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  4. Ixi, dedurou a tiazinha que passa droga,agora ja sei quem é... rsrsrs zuera!!! Gostei, muito bem escrito!!!

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